segunda-feira, março 30, 2015

Inventário

Pai.
Três letras com uma insignificância
enorme aos meus olhos.
não se indignem com os meus olhos,
eles só veem.

Por incrível que pareça,
enquanto os outros bebiam o morto
e se lamentavam do tempo que não tiveram,
eu tive neste natal a ceia mais maravilhosa,
diferente de todas as quais fui esquecido
quando menino.

Não é ranço, rancor nem mágoa,
são apenas constatações
permeadas de um humor negro.

Vim, vi e venci, tantas perdi
não sei...
Perdoa-me pai, perdoam-me se pequei.

Foi hora de esquecer e ser esquecido,
A vida te deu em colher de chá
e te tirou em concha de sopa
a mim, em conta-gotas.

Não me queiras mal aí no outro lado,
minha indiferença e falta de tato é algo tratável,
nada que uma boa análise não resolva.

Mas tu, pai, morrestes, ao menos por mim,
quase que esquecido,
uma falta mínima, irrisória de uma vida toda.

Esquecido até de si próprio
o que eu não acho triste
ou a dor te mataria antes do final,
se é que não
anteviste e foste.

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