segunda-feira, janeiro 05, 2015

Ainda uma vez adeus


Adeus qu'eu parto, senhora;
Negou-me o fado inimigo
Passar a vida contigo,
Ter sepultura entre os meus;
Negou-me nesta hora extrema,
Por extrema despedida,
Ouvir-te a voz comovida
Soluçar um breve Adeus!”
Gonçalves Dias.

I
Ainda uma vez adeus,
Deus sabe se sofro, Deus sabe de mim,
Alma alvoroço é vela caída,
No mais meu desgosto a tua partida,
Maior teu tormento, deixar-me enfim,

Sem nada que possa, essa impotência
Faz-se em mim, como ao sol a luzir.
Meu choro é calado, é pura demência,
Teus olhos de mel de turva eloquência,
Não mais me amará, não vais mais nutrir.

II
Ainda uma vez adeus,
Quem quer que assim quis,
Coração não tem, nem dádiva amor viveu,
Não sabe sonhar, amor se perdeu,
Destino do peito, tangente infeliz.

No corredor, adentro os olhares, a sorte aflita,
Vagueza de gestos, suprimidos os afetos,
O abraço que foge, a mão que suplica,
Teus olhos de mel, estranheza me dita,
Teu cheiro inda assombra, andares incompletos.

III
Ainda uma vez adeus,
Afirmas, meu amor menor que o teu. Que horror!
Afirmas, tão pouco eu te dei. Ferir-me é o intento?
Para ti foi tão pouco, que algoz pensamento,
Que cruel inverdade, que frio dissabor!

Teu corpo era o meu nome, teus olhos minha crença,
Teus beijos meu esteio, teus seios minha força,
A tua alma, pérola encantada da minha existência,
A minha, partida, quebrada, que torpe sentença,
Cheio de nódoa teu grito; estampido. Que eu não te ouça.
  
IV
Ainda uma vez adeus,
Dos corpos detidos, a tua descrença,
Dos beijos no ônibus, tua vaga lembrança,
Das mãos conjugadas, minha desperança,
O abraço espaçado, tua indiferença.

É de raiva e rancor que me afogo agora,
Nas batalhas pensei de estarmos sempre juntos,
Nem empunhaste tua espada, nem resistisse à aurora,
É de súbito que me viro, teu olhar vai-se embora,
No jardim da triste sina, nosso amor são dois defuntos.

V
Ainda uma vez adeus,
Lindo sonho, sem poder fugir presos na fugalaça,
Mãos atadas, cumpliciadas, selamos nosso destino,
Mas valeu, tigre traçou tão bem, que de inopino
Vejo tua derrota casar com a minha desgraça.

Não é verdade, eu sei, tanto lutaste e foste fera,
Sei que contra o tigre travaste garra contra garra,
Mas o sentir que esmaga o peito não muito espera,
E o nosso filho, hoje em dia é minha quimera,
Não foste fraca. Eu que não me livrei das amarras.

VI
Ainda uma vez adeus,
De pesar o peito abarrotado, ressuscito num soluço,
Deus sabe se bem te amei,
Deus sabe que por ti tanto esperei,
Mas o destino anteviu e foi astuto.

Perdoa... nessa tal sina, é assim que vivo,
E na calada do Largo, de vinho grito o teu nome,
No peito perduro nosso amor, que por vezes soa aflito,
O andar, puro desgosto, a alma, um labirinto,
Que em frangalhos, traça, bebe, corta..., some.

sábado, janeiro 03, 2015

Noite quente de inverno.

superLua.

Lua nova, deus novo, criado novo,
pele de sempre, cheiro de sempre,
do jardim que habitam várias flores.

Um pêssego tem inveja,
Dionísio te absorve e te contempla.
A amante... também tem inveja,
lá no alto, em lamúrias tempestivas.

Traição por amor não é traição,
é devoção.

Cada milímetro, cada camada,
cada curva eu entro em desespero,
procuro abafar o soluço,
de raiva, de tremor, de desejo.

Fazer estrago,
Desenhar não o teu corpo,
mas tua áurea infinita,
tua alma cética pagã.

Cheiro, cheiro, cheiro, cheiro...
Como é bom o teu cheiro.
Ele fala comigo, me diz do perigo,
Da sentença que é morte.

Eu quero mais, eu quero,
E quanto mais eu quero, eu quero,
Mais me alucino; se quero.

Viro menino... safado.

Cheiro, cheiro, cheiro...

Quanto mais cheiro me vicio,
Mais me curo no teu cheiro,
de Alice devota,
de Young alucinógena,
de Clarah travestida.

A loucura da tua pele tem a medida da minha maldade.