sábado, dezembro 20, 2014

Despojos

Caem as tuas vestes de semblante amargurado.
Teu corpo, pêndulo desestruturado,
Mão de meu braço, pena do meu corpo,
Lágrimas abafadas de desgosto.

Submersos entre o fim e o começo,
A solidão aflita segue pelo estreito,
Na dádiva de um tormento imposto
Do pecado nublado, teu a contragosto.

Bebe o vinho, fuma e inala a discórdia...
O bem mais precioso é de outrora a mixórdia,
Às costas, dou-te a cabana do pensamento,
Soberba na ocasião da angústia do firmamento.

Dói em mim tua cor azul opaca e vencida,
Tua febre de mim, estrela decaída,
Marca de meu rosto teu rancor dissoluto,
Nosso amor guerreiro persiste astuto.

Vence mais uma batalha pelos flancos,
Desisto, desiste, conflito nos barrancos,
Espadas e vestes de guerra vencida,
Teus sonhos, minha comoção combalida.

Lutar, lutar, que importa vencer?
Suar, juntar destroços, é fácil dizer,
Amar, escurecer, arder, para depois impor,
Revolta, odiar a própria alma, excomungar o amor.

Os despojos desta guerra invencível,
São cacos de tormenta irascível,
São perdas e danos da fartura amanhecida,
São idas e vindas, solidão suada e comprimida.

As mãos, sustentáculos marcados na testa,
Nos ombros, o peso da injúria funesta,
No peito, bigorna em ferrugem decide
aliviar na língua vingança. Revide.

Declara-se fulgente e abatido teu querer fugaz,
A insigne assinatura lavrada do teu corpo mordaz,
Meu corpo trêmulo, abatido, te faz a jura repetida,
Na tua boca me misturo, te sorvo, te faço arrependida. 

Acordo de paz temporário, somente um instante
para nos amarmos em fúria. Teu corpo. Azul brilhante.
A fome da tua áurea incandescida é meu deleite,
Tomo-te por inteira... até o oco dos teus ossos.

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