Eu
te amei desde que os teus olhos de mel invadiram o meu espaço.
Meu
pequeno espaço. Uma sala 2x2 de janela selada e restrita com a placa:
Aqui
ninguém entra, ou fica à vontade.
E
você quebrou as trancas enferrujadas corroídas de lágrimas ácidas e pernoitou
jogando pôquer contra a solidão e a morte. O acordo era que se você perdesse
não mais voltaria ali, nem em pensamento, mas caso contrário, as duas teriam
que bater em retirada sem nem ao menos olhar para trás. Preciso dizer quem
ganhou?
E
você acendeu a luz, e com um pano feito de sua própria pele foi tirando o pó do
meu corpo inteiro. Confesso que no começo eu tentei te expulsar várias vezes. Sentia
falta das minhas sórdidas companheiras. Apagava a luz sorrateiramente para você
se perder ou se cansar e querer sair dali, foi em vão, você mais e mais
permaneceu, fincou os pés e ali se plantou. Linda, até mesmo com o suor na
testa e o cabelo cor de tangerina todo desgrenhado.
Foi
difícil, eu sei, mas você persistiu, e persistiu, e chorou, e novamente
chorou..., mas você mesmo com o peito latejando, e as forças se extinguindo,
permaneceu ali, com a bandeira do amor em punho, intensificando o que acreditava
e que te fazia sentir mesmo assim, viva. Foi difícil e ainda é.
A
luz que refletia dos teus olhos resplandeceu e iluminou todo o compartimento, foram
dias e noites esvaziando gavetas, com os dedos sangrando e os olhos relutando. Retirou
o pó, porém inalou a poeira, pintou as paredes, mas se sujou inteira, mudou o
lugar dos móveis, ganhou machucados extras, trocou as cortinas, deu uma nova
roupagem e cores vivas a todo o ambiente, isso tudo doeu, e choraste tantas
vezes. Fez-se morada a esperança, porque meu coração se fez em cor, saca?! Hoje
não há penumbra, não há escuridão, o sol aquece cada canto da sala, o vento
canta e dança com as cortinas, e a tua presença marcada pelo teu cheiro se
misturou permanentemente em mim.
Nessa
invasão, você chegou assim, já sabendo o que queria, que me queria,
independente do que quer que eu fosse. Tirou-me de uma prateleira empoeirada, --
confesso que imaginava nunca mais sair dali. E assim, página por página, lendo
e relendo, se machucando nas histórias, em um esforço descomunal a cada dia, rasgavas
uma página de mim, e no verso da mesma folha reescrevias uma nova história, e
ainda escreves, ponto a ponto. E nas tuas mãos me faço um livro de pequenas
grandes coisas, momentos que valem a pena pelo fato de que são nossas memórias
misturadas e convividas.
Sou
teu livro, que dia a dia reinventas, nós dois sabemos disso. E hoje sou um novo
título, novos parágrafos, novas frases, novo enredo, em tua escrita sou pontuação
cadenciada, um mundo de sonhos e fantasias que se fazem nossas, só nossas. Teu
livro. Sou teu livro.
P.S.: À escritora que escreve em minha vida.